Legenda da Fotografia nº10.

Ouvi os criados, ao longe, dizer que eu havia enlouquecido de vez, mas que me importa? Nunca me importou, e agora, menos do que nunca; menos do que nada!  Ah, quando escutei o carro entrar ao portão.... pensei que fosse ele que chegasse, e sabem que, então, o meu coração transbordava de alegria! Mas não: não reconheci o veículo e logo estaquei. O meu coração já tinha outra batida, completamente diferente, reconhecendo o medo, sentindo o perigo. Dois policiais fardados abriram a porta do carro negro, que contrastava com a beleza do dia colorido de momentos antes, e saíram. Dirigiram-se a mim, em atitude de reconhecimento, o primeiro, talvez superior do outro, não sei, não me interessa, oferecendo-me as mãos. Enquanto eles se proximavam, eu afastava-me, mas não pude deixar de notar, apesar dos olhos já embaciados, a tentativa de consolo, ou deixar de ouvir palavras como "Sinto muito, Senhora, mas não pudemos fazer nada. O outro carro...". Então corri, fugi dali e regugiei-me em casa. Ia esconder-me no nosso quarto, trancar a porta, mas não tive forças para chegar até lá... Encostei-me à parede e escorreguei até cair sentada num dos degraus da escada. Comigo caiu o espelho onde igualmente me encostara, que se estilhaçou. Enquanto, finalmente, deixava que o riso da manhã fosse substituído por lágrimas quentes e grossas,  lembrei-me das suas cartas apaixonadas, dos seus beijos, dos seus braços à minha volta, do seu amor. Peguei num dos estilhaços do espelho, e não foram corações e flores que escorreram dos meus dedos: era sangue – cortara-me. De qualquer forma, que importava? Não sentia. Estava dormente. Olhei para o espelho, o rosto desfigurado, a mesma destruição nos traços que sentia dentro de mim. O meu amor, o meu amado, o meu homem ausentara-se... para sempre! Senti o coração rasgar-se. De verdade, não como nos descrevem nos livros ou nas canções. Achei que estava morta. Oh, meu Deus, e como queria estar! Coloquei o espelho à frente dos lábios. Passaram-se segundos, depois longos minutos. Não embaciou. Finalmente, eu não respirava.